Praça Rodrigues Lobo

A Praça e os seus motivos

No século XIII, a Praça Rodrigues Lobo, denominada deste modo a partir de 1877, tinha uma forma muito diferente da que conhecemos hoje em dia. Na época, chamava-se Praça de São Martinho por nela se encontrar a Igreja de São Martinho, construída no séc. XII. Em 1383, na Praça de São Martinho, entre a Rua Direita e a de São Francisco, existia o Moinho de Mancebia, que em 1400 foi transformado em Moinho de Azeite e que era propriedade do Rei. Perto deste moinho, encontravam-se os banhos públicos, situados no largo dos Banhos (freguesia de São Martinho) junto à judiaria e outros lagares de azeite [1]. A Casa da Câmara, a Cadeia, o Pelourinho e o Paço dos Tabeliães situavam-se frente à Igreja de São Martinho. O Rio Lis passava junto à Igreja de São Martinho, fazendo um ângulo reto para norte, mas tendo em conta as pressões por parte dos procuradores da cidade, foi realizado, entre 1699 e 1702, um desvio do leito do rio para evitar as cheias frequentes que decorriam na cidade e que devastavam as culturas e bens dos habitantes, o que comprometia a saúde pública.

O espaço frente à igreja, que em tempos teria sido uma necrópole, transformou-se num ponto central de comércio e, consequentemente, passou a atrair novos habitantes, em particular famílias nobres. Com a criação do episcopado de Leiria, D. Frei Brás de Barros, primeiro bispo de Leiria [2], acordou com a cidade uma troca de terrenos. A cidade cedeu os paços que serviam de Câmara, junto da Igreja de São Pedro, e a igreja cedeu parte do rossio e o assento da Igreja de São Martinho. A Igreja de São Martinho foi demolida para construir uma praça. Com a demolição da Igreja de São Martinho, ter-se-ia que edificar uma nova Sé. Deste modo, após 1546, com o surgimento desta nova Praça, o espaço urbano sofreu uma alteração, verificando-se um aumento da população nesta área, por ali se realizarem as mais importantes transações comerciais.

Apesar de inicialmente a classe aristocrática e a nobreza preferirem habitar nos edifícios do interior das muralhas do Castelo, com o passar dos tempos e nomeadamente após a construção da nova praça, as pessoas das classes mais altas foram habitando casas fora do limite dos muros. Deste modo, foram surgindo edifícios vistosos na várzea do rio. No séc. XVI, foi construído o palácio do Marquês de Vila Real que possuía uma frente voltada para o Rossio e outra para a Praça Rodrigues Lobo. Este palácio era constituído por duas partes ligadas por um arco que estabelecia a ligação da praça com o Rossio e ocupava toda a parte sudeste da praça. Este edifício foi adquirido por Joaquim Zúquete em 1888. Parte deste edifício foi demolido no final do séc. XIX e, mais tarde, o Arquiteto Korrodi reconstruiu uma parte do edifício conhecido hoje como Edifício Zúquete.

O Edifício Zúquete contém na sua fachada três tipos de faixas de azulejos, o que designamos em Matemática por frisos. Como iremos observar mais abaixo, estes objetos têm como base o estudo das propriedades de simetria de uma figura. No caso dos frisos, existem apenas 7 tipos diferentes, ou seja, 7 formas diferentes de construir um friso a partir de uma figura base.

O arquiteto Korrodi foi extremamente influente na cidade de Leiria, sendo vários dos edifícios mais emblemáticos de Leiria por si projetados. Da praça podemos observar uma outra obra de Korrodi, a Casa do Arco. Esta obra tinha como objetivo aumentar a área habitável de um edifício.

Para além da beleza do edifício, encontramos nesta casa azulejos bastante estimulantes do ponto de vista matemático. Quando analisamos um mosaico, procuramos determinar o seu padrão, isto é, identificar o processo de repetição do motivo. Existem 17 tipos diferentes de formas de construir um mosaico (no plano); matematicamente foi provado que existem 17 grupos cristalográficos (bidimensionais). Para perceber a diferença entre eles é necessário perceber o conceito de isometria, nomeadamente, os conceitos de translações, rotações, reflexões e reflexões deslizantes. A ideia base é perceber como podemos repetir um motivo num plano.

Por exemplo, na casa do arco encontramos o seguinte padrão de repetição

no qual o motivo é a seguinte imagem

Este motivo é repetido por reflexão (ou rotação) e de seguida aplica-se a translação. Tendo em conta a forma como é construído, classificamos como pertencente ao grupo cristalográfico p4m.

A calçada portuguesa também pode ser classificada desta forma (quando se trata de simetrias deste tipo), como é o exemplo da calçada que pisamos desde a Sé até à praça.

No entanto, o pavimento da Praça Rodrigues Lobo é classificado de forma diferente porque revela uma simetria radial, estamos perante uma roseta [3].

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Referências:

Gomes, S. A. (1990). A praça de São Martinho de Leiria do século XII à reforma de 1546. Sep. de: Mundo da Arte: Revista de Arte, Arqueologia e Etnografia, II, 57-77.

Gomes, S. A. (1993). A organização do espaço urbano numa cidade estremanha: Leiria Medieval. Sep. de: A cidade. Jornadas Inter e Pluridisciplinares. Actas II. Lisboa : Universidade Aberta., 83-113.

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[1] Gomes, S. A. (1993). A organização do espaço urbano numa cidade estremanha: Leiria Medieval. Sep. de: A cidade. Jornadas Inter e Pluridisciplinares. Actas II. Lisboa : Universidade Aberta., 83-113.

[2] Foi bispo de Leiria entre 1545 e 1556.

[3] figura plana limitada, que tem centro e tem simetria de rotação ou simetrias de rotação e de reflexão, mas não possui simetria de translação.