Tese de doutoramento

tese de doutoramento é um género escrito do discurso académico. Integra-se, em particular, no conjunto de géneros disponíveis para os membros da comunidade discursiva que se dedica a atividades relacionadas com a investigação e com o ensino superior. Tem uma dupla dimensão, científica e pedagógica, no sentido em que, por um lado, resulta de uma pesquisa científica, e, por outro, a sua elaboração e defesa oral se norteia pela obtenção do grau de doutoramento, mediante aprovação em provas públicas da investigação nela exposta.

Os textos do género tese de doutoramento são produzidos por indivíduos que, no âmbito de atividades de natureza académica, assumem o papel socioprofissional de investigadores e estudantes. O objetivo de obtenção do grau condiciona a sua elaboração, no sentido em que os autores têm de demonstrar possuir as competências necessárias para ingressar na comunidade sociodiscursiva de uma dada área disciplinar. Dependendo dessa área, entre as competências a demonstrar contam-se as seguintes: descobrir causas, origens ou soluções para problemas de índole científica, conceber e realizar uma investigação de tipo experimental com resultados validados e pertinentes para o avanço do conhecimento científico, refletir criticamente sobre propostas teóricas disponíveis na área disciplinar em questão, adotar um modelo teórico-metodológico adequado ao objeto de estudo, proceder à análise de um tema no quadro desse modelo, extrair conclusões válidas da análise ou reflexão efetuada, comunicar adequadamente os resultados do processo de investigação, etc. Podem incluir-se também competências relacionadas com a concretização de um trabalho de campo (recolha de dados, constituição de acervo, escavações, etc.) e com a conceção de um projeto que vise a elaboração/construção de um dispositivo, maquete, software, etc.

A tese de doutoramento incide em temas específicos da área disciplinar em que se realiza a pesquisa. São requisitos obrigatórios que esses temas sejam considerados relevantes e que a investigação produza conhecimento original, permitindo que haja avanços nos conhecimentos da área em causa. Os temas selecionados e as práticas da comunidade académica em que o autor se situa condicionam as opções tomadas a respeito do plano de texto, do léxico especializado e, até, das estruturas frásicas.

Os textos deste género podem apresentar planos cuja escolha é geralmente feita de acordo com as práticas habituais da área disciplinar e com as preferências de quem for responsável pela orientação da pesquisa, além das opções individuais. Reconhecem-se habitualmente os modelos IMRDC, AntologiaTópicos. Uma variante consiste na combinação das suas propriedades, o que origina uma quarta possibilidade: o modelo Misto.

A sigla IMRDC reporta-se a uma divisão em secções ou capítulos: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão e Conclusão. Dos títulos dos capítulos pode inferir-se os tipos de conteúdos que incluem: enquadramento geral na Introdução (apresentação do tema, dos objetivos, do modelo teórico, etc.); métodos adotados e passos seguidos na Metodologia; dados recolhidos e respetiva interpretação no capítulo relativo aos Resultados; reflexão e problematização dos resultados obtidos no capítulo relativo à Discussão; sistematização final nas Conclusões (indicação das principais ideias a reter, sua relevância, pesquisas futuras, etc.). É um dos modelos mais frequentemente adotados em áreas disciplinares de natureza predominantemente experimental, em particular nas Ciências (Biologia, Química, Física, Engenharias, Ciências Farmacêuticas, etc. 

Antologia organiza a tese de doutoramento como uma compilação de artigos científicos, redigidos ou exclusivamente pelo autor da tese ou em coautoria, já publicados em revistas científicas, ou, pelo menos submetidos ou aceites para publicação. O número de artigos é variável, oscilando habitualmente entre um mínimo de três e um máximo de seis. Estes artigos que, na tese, constituem diferentes capítulos, são enquadrados por uma Introdução geral e pelas Conclusões gerais. 

A estruturação por Tópicos consiste numa organização menos previsível dos capítulos da tese. Além dos fatores acima referidos (práticas da comunidade, indicações de orientação e opções pessoais), é determinada também pelo tema que constitui o objeto de estudo. As teses estruturadas desta forma incluem um capítulo de Introdução e um outro relativo às Conclusões, que não são necessariamente designados por estas etiquetas. Os restantes capítulos podem incidir em temas diversificados, nomeadamente em aspetos parcelares do objeto de estudo que permitam uma reflexão aprofundada e consequente sobre o tema abordado. A estruturação por tópicos é mais frequentemente associada a áreas disciplinares das Ciências Sociais e Humanas (Direito, Sociologia, Economia) e das Humanidades (História, Literatura, Artes).

Por fim, no modelo Misto, a combinação de propriedades dos outros modelos configura-se de formas variáveis. São atestados casos em que a um modelo IMRDC se associam capítulos determinados pelo tema tratado na pesquisa (ou seja, próprios da estruturação por tópicos). Observa-se também que, numa tese organizada predominantemente segundo o modelo de estruturação por tópicos, podem surgir capítulos como a Metodologia, os Resultados ou a Discussão, os quais são típicos do modelo IMRDC ou de cada um dos capítulos/artigos do modelo antológico. Entre outros casos possíveis, verifica-se também que, em teses globalmente organizadas segundo o modelo IMRDC, são inseridos capítulos correspondentes a artigos publicados, aceites ou submetidos para publicação em revistas científicas. A estruturação que segue um modelo misto pode, por isso, ser encontrada em qualquer área disciplinar.

As teses de doutoramento evidenciam também propriedades específicas de natureza estilístico-fraseológica. Nos textos deste género, espera-se que seja adotado um estilo formal e tendencialmente objetivo, que, em simultâneo, seja claro, preciso e inequívoco na maneira como os conteúdos são expostos. Estes requisitos concretizam-se em aspetos como a seleção de léxico específico de cada uma das áreas disciplinares no seio das quais a pesquisa é desenvolvida, mas, de igual modo, na sintaxe (em particular, no que diz respeito à seleção de estruturas de coordenação e de subordinação, assim como à extensão das frases) e na pontuação (caracterizada pela sobriedade, em contraste com a expressividade muitas vezes atestada nos textos de natureza predominantemente subjetiva). Em todos os casos, espera-se que estejam em conformidade com as propriedades típicas dos textos do discurso académico, permitindo a leitura e a interpretação inequívoca dos conteúdos manifestados.

No âmbito da componente estilística, diferentes áreas do conhecimento concretizam de modos diversos os valores de clareza e rigor já mencionados. Nas disciplinas de pendor experimental (Biologia, Química, Física, Engenharias, Ciências Farmacêuticas, Medicina), há a tendência para redigir frases mais curtas e adotar um estilo impessoal, de que estão ausentes deíticos indiciais (como verbos e pronomes de 1.ª pessoa do singular e do plural, ou adverbiais temporais e espaciais que denunciem uma origo ancorada na situação de comunicação). Noutras áreas disciplinares de natureza predominantemente reflexivo-argumentativa, como as das Ciências Sociais e Humanas (História, Sociologia, Direito, etc.) e das Humanidades (Literatura, Artes, Arquitetura, etc.), é comum observar-se um estilo que pode ser mais personalizado, em graus variáveis. Nestes casos, o texto pode conter marcas relativas ao autor (formas verbais e pronominais de 1.ª pessoa do singular ou do plural) e às circunstâncias temporais, espaciais ou outras em que a pesquisa foi desenvolvida e em que é comunicada. Dependendo da área disciplinar, do tema abordado e das opções do investigador, é comum o texto da tese incluir imagens, tabelas, quadros, gráficos, etc., que sistematizem os conteúdos que são objeto de reflexão.

Entre os mecanismos de coesão usados, merecem destaque as remissões internas (que antecipam conteúdos a ser referidos adiante ou remetem para outros já mencionados), as cadeias referenciais, a substituição (em particular, por sinonímia e por hiperonímia/hiponímia), assim como a seleção e uso abundante de conectores lógico-causais.

Todos os exemplares de teses de doutoramento assinalam o género em que se inserem de forma explícita, através de marcadores que são etiquetas autorreferenciais na capa e na folha de rosto. Conforme as práticas académicas das universidades há um conjunto de informações que devem obrigatoriamente aí figurar: designação da instituição que confere o grau (departamento, faculdade, universidade); nome do/a autor/a; título (e, eventualmente, subtítulo) da tese; área científica e especialidade da tese; nome do/a(s) orientador(e/as) científico/a(s); ano de submissão da tese.

Além da capa e da folha de rosto, diversos outros textos enquadram os capítulos da tese de doutoramento. Previamente a esses capítulos, as teses incluem quase sempre Resumo e Palavras-chave (na língua em que é redigida a tese e noutras línguas, em especial o inglês), Agradecimentos, Índice geral, e, eventualmente, Índices diversos (de imagens, de tabelas, de quadros, de gráficos, etc.) e Listas várias (de abreviaturas, de fórmulas, etc.). Após o capítulo final da tese¸ constam as Referências bibliográficas e ocorrem frequentemente Anexos diversos (questionários, fórmulas, mapas, imagens, corpusde textos analisados, etc.).

Os exemplares do género tese de doutoramento encontram-se em suporte papel e/ou em suporte digital. Nos últimos anos, as instituições de ensino superior têm vindo a adotar preferencialmente o suporte digital, por razões diversas, de que se destaca a facilidade na circulação, na consulta e na disponibilização online de textos nesse suporte, além dos custos financeiros e ecológicos associados à impressão e fotocópia de textos extensos. Assim, é cada vez mais usual que, depois de ser obtida a aprovação nas provas públicas, um exemplar da tese em suporte digital fique acessível online num repositório institucional aberto ao público em geral, seja de imediato (com o consentimento do autor do texto) ou após um período de tempo definido pela instituição.

A descrição efetuada responde a critérios de descrição e classificação geralmente adotados no âmbito da Análise do Discurso (Maingueneau, 2014), da Teoria do Texto e da Linguística Textual (em particular, na Análise Textual dos Discursos, segundo Adam, 2008) e no Interacionismo Sociodiscursivo (Bronckart, 1997).

Referências

Adam, J.-M. (2008). La linguistique textuelle. Introduction à l’analyse textuelle des discours. 2.e éd. Armand Colin.
Bronckart, J.-P. (1997). Activité langagière, textes et discours. Delachaux et Niestlé.
Maingueneau, D. (2014). Discours et analyse du discours. Armand Colin.

Forma de referenciação sugerida

Silva, P. N. (2021). Tese de doutoramento. Retirado de: https://sites.ipleiria.pt/pge/tese-de-doutoramento/

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